" Carlos d'Alge: o elegante poeta português "
" Expoente do ensino da literatura portuguesa na UFC, Carlos d'Alge foi uma das vozes que consolidaram a audiência da Rádio O POVO/CBN. Aos 82 anos, resume-se aos próprios pensamentos "" Carlos d’Alge é daqueles homens que a ignorância hesita acreditar existir. Pregou que os livros libertam da dor o coração. Duvidou que se pudesse ser algo sem a loucura ou o sonho. Definiu-se nos versos de Fernando Pessoa. Recitou “minha tristeza consiste em não saber bem de mim... Mas a alegria é assim”.
Tem disso essa elegante figura que marcou o ensino da Literatura Portuguesa no Ceará. D’Alge é português, membro das Academias Cearenses de Letras e da Língua Portuguesa. Menino, veio ao Brasil poetar o que ficou lá e, assim, publicou mais de dez livros e, finamente, “desengalfinhou” jornalistas embebidos em fervorosas opiniões praguejadas num dos programas de rádio mais famosos da Fortaleza da década de 1980.
Essa mesma figura elegante - o “culto fidalgo europeu”, como entoam admiradores - hoje, prefere impor a si o silêncio dos próprios pensamentos. Aos 82 anos de idade, o poeta português se reserva à mente. Sofre com a depressão a que o levou o tempo. Mesmo tempo que já o fez imortal nos meios acadêmico e jornalístico.
“Ah! Não fosse a tranquilidade de Carlos d’Alge em nos mediar, talvez eu e Themístocles tivéssemos cravado uma luta livre, literalmente”, recorda a jornalista Adísia Sá. Mediados por d’Alge, ela e o jornalista Themístocles de Castro e Silva protagonizaram, no radiofônico Debates do Povo, da Rádio O POVO/CBN, um dos programas de debate de maior audiência da rádio cearense. O forte trio de jornalistas fez da década de 1980 um dos momentos áureos do jornalismo nas rádios e ajudou a consolidar a emissora do Grupo de Comunicação O POVO, que, em 2012, completou 30 anos.
Além da rádio, na mesma década de 1980, Carlos d’Alge foi escolhido para integrar o Conselho Editorial do O POVO e nele ficou por quase 20 anos. Publicou, nesse tempo, artigos que falavam de política, literatura, educação e do cotidiano. “Até hoje, guardo recortes dos artigos dele”, revela o colega de Academia Cearense da Língua Portuguesa e admirador, professor Myrson Lima, um dos que lembram Carlos d’Alge como homem culto, sempre muito elegante e gentil. “Um homem cordial que, afora a carreira jornalística, prestou inestimável serviço ao ensino da Língua Portuguesa nas universidades”, define.
Família
Relatos dão conta também que algo mais - além de todo conhecimento - favorecia a admiração que o professor de Literatura suscitava. A filha do meio, Maria Cláudia d’Alge, 50, lembra que o pai sempre ia todo pronto, elegante e cheiroso à Universidade Federal do Ceará (UFC). Tão educado e de fala tão correta que criava até certo “frisson” entre as meninas.
“Mas ele sempre foi muito correto. Tanto que só aceitou ser meu professor, quando foi substituir o professor e escritor Moreira Campos numa cadeira, se o próprio Moreira corrigisse minhas provas e trabalhos”, narra a filha, que estudou Letras na UFC.
Nunca foi de conversar muito, segundo Maria Cláudia, mas quando abria a boca era para falar de livros e livros. “Ele dizia: ‘Maria Cláudia, faça você o que fizer da vida, lembre-se sempre que a leitura vai ajudar em tudo na sua vida, na tristeza, na alegria, nos momentos futuros com seus filhos’”, relata, emocionada, a filha. E emenda: “Ele sempre foi um modelo de honestidade e extremamente gentil. Fico triste que as gerações mais jovens não o tenham como professor. Esse homem tem mais alma de poeta do que de qualquer outra coisa”, define.
ENTENDA A NOTÍCIA
O jornalista e escritor Carlos d’Alge é um dos tradicionais nomes do jornalismo no Estado. Hoje, aos 82 anos, infelizmente, encontra-se em depressão profunda. O POVO presta homenagem a esse ilustre cidadão.
Perfil
Carlos Neves d’Alge nasceu em Chaves (região do norte de Portugal, quase fronteira com a Espanha) no dia 24 de julho de 1930.
Ainda criança veio morar na cidade de Belém/PA, porque o pai era ponte comercial entre essa cidade e Portugal. O avô português já morava em Belém e era casado com uma cidadã brasileira.
Aos 18 anos, militante de esquerda, foi convidado para ir ao Leste Europeu com outros comunistas brasileiros. Na volta, se instalou no Rio de Janeiro e começou a trabalhar como jornalista no Correio da Manhã.
Veio a Fortaleza com a família à convite dos donos de O Jornal, para ajudar a instituí-lo e mantê-lo. Daí para frente, foram 40 anos de atuação jornalística ainda em A Fortaleza, Ceará Jornal, O Estado e O POVO, onde foi membro do Conselho Editorial por quase 20 anos.
Na década de 1980, foi mediador do programa Debates do Povo.
É ensaísta, cronista e professor com vasta experiência no campo do ensino e da pesquisa. Dimas Macedo, ao analisar seu livro de poesia, disse que ele é “o poeta verdadeiramente identificado com o seu tempo”. Publicou dez livros.
Depoimentos
“É um grande mestre, um grande amigo e um grande escritor”.
Horácio Dídimo, professor aposentado da UFC, membro da Academia Cearense de Letras, amigo de Carlos d’Alge.
“Que ele saiba o quanto é respeitado, o quanto ele influiu e contribuiu para a formação das pessoas. Tenho orgulho de ser afilhada dele”.
Karla Karenina, atriz e afilhada de Carlos d’Alge.
“Ser um homem cordial e sempre impecável é uma marca. Homem culto, prestou serviço inestimável ao ensino da língua portuguesa no Ceará”.
Myrson Lima, professor e membro da Academia Cearense da Língua Portuguesa.
“Nós, seus filhos, sempre tivemos sua delicadeza de espírito e sua presença intelectual. Carrego seu exemplo para minha vida profissional como professora que sou”.
Maria Cláudia d’Alge, filha de Carlos d’Alge.
“Sempre de voz muito tranquila, Carlos nunca se alterou”.
Adísia Sá, jornalista e colega de trabalho de Carlos d’Alge durante o Debates do Povo."
FONTE: JORNAL O POVO
http://www.opovo.com.br/app/opovo/fortaleza/2013/02/16/noticiasjornalfortaleza,3006923/carlos-d-alge-o-elegante-poeta-portugues.shtml
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