FOTO: VIVIANE PINHEIRO - DIÁRIO DO NORDESTE
" Praça Dom Pedro II, no Centro: as pessoas gostam do feriado e da folga que ele proporciona aos
trabalhadores, mas pouco conhecem o significado da data em questão "
" PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA "
" Significado do 15 de novembro é pouco conhecido "
" Para o pesquisador Miguel Ângelo de Azevedo, Nirez, há uma clara tendência da cultura monárquica no Ceará "
" A Avenida Duque de Caxias e as ruas Floriano Peixoto, Senador Alencar, Guilherme Rocha e General Bizerril são apenas algumas das inúmeras referências na área central de Fortaleza aos personagens que participaram, direta ou indiretamente, da implantação República no Brasil. Sem falar que, em outros bairros da cidade, vias públicas e monumentos também fazem alusão ao regime instaurado em 15 de novembro de 1889, como por exemplo, a Rua Marechal Deodoro, no bairro do Benfica.
Contudo, pesquisadores e educadores observam o pouco conhecimento dos moradores da Capital em relação aos acontecimentos que levaram à transição da monarquia para a República. Existe, ainda, quem acredite que, em Fortaleza, há um predomínio de referências ao regime monárquico, representado na denominação de inúmeras vias, tais como a Avenida do Imperador e as ruas Princesa Isabel, Liberato Barroso, Major Facundo e Dona Leopoldina.
Para o pesquisador Miguel Ângelo de Azevedo, Nirez, o que predomina mesmo é o desconhecimento da população sobre a história do País e quanto aos eventos políticos que levaram a derrubada da monarquia e a proclamação da República. "Se você fizer uma enquete hoje, as pessoas vão dizer que gostam do feriado, mas poucos irão entender os motivos para isso", ponderou.
Contudo, o pesquisador apontou uma tendência muito clara na cultura cearense ao regime monárquico. "Há uma predileção mesmo. Senão, vejamos, é o Rei da Música, Roberto Carlos; o Rei do Baião, Luis Gonzaga", disse, lembrando que o País já elegeu várias rainhas do Rádio. Além disso, na cidade, verifica-se essa tendência até no nome de restaurantes. "Temos aqueles que se autodenominam de Rei da picanha ou de o Rei do baião-de-dois e por aí vai".
Sobre o fato de a proclamação da República ter acontecido sem grandes traumas ou derramamento de sangue, Nirez comenta ser essa outra característica do povo brasileiro.
Gradativo
"Mas a denominação das ruas e avenidas foi acontecendo de forma natural, gradativa", analisou, acrescentando que a antiga Rua das Flores deu lugar à Castro e Silva; a Rua da Municipalidade é, hoje, Guilherme Rocha; a Rua do Quartel recebeu o nome de General Bizerril.
Já a professora da Ensino Médio da rede estadual Lúcia de Fátima Moura ressalta que há um "déficit de conhecimento sobre o País". As questões políticas e sociais ficam em segundo plano. "E quando são contadas, retratam o lado oficial. Na verdade, o que prevalece é a falta de informações", avalia.
Ontem, a aposentada que frequentava a Catedral de Fortaleza, Aldaíra Soares da Silva, 70 anos, enfatizou que "todo mundo gosta do feriado, mas poucos sabem o real significado de uma data tão importante"."
MOZARLY ALMEIDA
REPÓRTER
" A opinião do especialista "
" Sem memória coletiva "
" Na prática, a sociedade de corte implantada no Brasil nunca deu muito certo. Mas, na memória, nada conseguiu fazer mais sucesso. Nesse caso, Fortaleza não é exceção: suas ruas e seus monumentos trazem os nomes da realeza. Uma persistência da recordação oficial.
Por outro lado, é possível encontrar perto da Avenida do Imperador ou da Rua Princesa Isabel, um "Rei da Panelada", um "Rei dos Queijos", alguém que tenha o sonho de participar do programa "Princesa por um dia" ou coisa parecida. Além disso, a Rainha do Maracatu, o Rei do Cangaço, e assim por diante. Há, enfim, um ar de monarquia tropical, com paçoca de sushi ou tapioca de petit gateau.
E a república? Veio com as conciliações. O prédio que hoje abriga o Museu do Ceará é simbólico nesse sentido. No alto da porta central, ainda há um brasão real, em contraste com o selo do novo regime que foi posto logo acima. Por isso, o feriado também sempre esteve em segundo plano e, pelo visto, nunca passará para o primeiro.
Nem mesmo a educação escolar dos regimes mais autoritários, como o de 1964, conseguiu criar uma memória coletiva em torno de Deodoro. Aliás, a rua que, em Fortaleza, se chama Marechal Deodoro é mais conhecida como "Cachorra Magra". E tem mais: até inícios do século XX o retrato de D. Pedro II costumava ficar no oratório doméstico, porque muita gente pensava que, com aquela barba branca, ele era santo.
Como dizia Sérgio Buarque, o País se fez com "homens cordiais". Mas sua previsão não se realizou, porque a urbanização no século XX não popularizou os valores republicanos, e sim o desejo de consumo. O shopping center virou lugar de reverência, para ricos e pobres. Ricos e pobres querem ter as coisas que reis e rainhas talvez tivessem."
* Régis Lopes
* Professor do Departamento de História da UFC
FONTE: JORNAL DIÁRIO DO NORDESTE
http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=1070404
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